Laird Hamilton, o inventor do surfe
Por Emanoel AraĂșjo
VocĂȘ pode chamĂĄ-lo de egoĂsta, por ter abandonado sua dupla de tow-in na praia com a perna aberta e ter voltado ao mar para encarar ondas de atĂ© 20 metros.
E achĂĄ-lo vaidoso apĂłs ter surfado a onda do milĂȘnio e logo depois ter abandonado seus melhores amigos, ou melhor, demitido parte de sua equipe para brilhar sozinho.
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Talvez seja muita presunção dele se considerar um dos melhores surfistas da história sem ter disputado um campeonato sequer.
Mas o fato é que Laird Hamilton sempre se esforçou demais para ser exatamente quem é: um obcecado pelo surfe. E ninguém no mundo desenvolveu tanto o assunto quanto o pai do quadricóptero, ou como é mais conhecido, o foil.
NADADOR NATO
A relação com o mar vem desde o inĂcio da vida. A mĂŁe, Joann Zyrek, participou de um estudo em SĂŁo Francisco, CalifĂłrnia, chamado batisfera. O objetivo era sugar lĂquidos do abdĂŽmen e dar mais espaço para a criança dentro da placenta. Por coincidĂȘncia ou destino, ele jĂĄ nadava antes mesmo de respirar.
ApĂłs ser abandonada pelo marido, Joann buscou a liberdade prometida que o HavaĂ da dĂ©cada de 60 oferecia aos americanos com o filho junto. A conexĂŁo com o surfe foi tĂŁo imediata quanto a entrada de Bill Hamilton (uma lenda do esporte por lĂĄ) na vida de sua famĂlia. Ele se tornou seu padrasto, lhe deu seu sobrenome e uma lição: nunca competir.
âComo cresci muito ligado a competição, observar Bill Hamilton [padrasto] surfando uma competição na qual devia ter ganho e... perdendo, aquilo me deixava com um amargo na bocaâ
:: MODELO DE SURFISTA
Sem disputar campeonatos que, normalmente, tinham ondas pequenas, Laird não conseguia dinheiro para bancar equipamentos e viagens para ondas maiores. Um fotógrafo da revista Vogue, de passagem pela ilha de Oahu, era tudo o que o surfista de 17 anos precisava para ganhar algum dinheiro em sessÔes de fotos.
O sucesso do modelo-surfista chegou ao seu ponto alto na dramaturgia. Em 1987, Laird fez sua estreia na indĂșstria do cinema com âNorth Shoreâ, no qual interpretava o vilĂŁo. Desempenhou tĂŁo bem o papel que chamou atenção para outras participaçÔes e assim se revezou entre trabalhos como modelo/ator e seguiu experimentando as vĂĄrias formas de aproveitar o mar atĂ© chegar no windsurf.
:: EMBRIĂO DOS AĂREOS
Com os pĂ©s presos na prancha e a possibilidade de fazer manobras aĂ©reas, o windsurf mostrou, pela primeira vez, a capacidade criativa de Laird Hamilton. O esporte permite que vocĂȘ entre em ondas com segurança para realizar manobras mais ousadas, como Ă© possĂvel ver no vĂdeo abaixo:
Munido de uma prancha com velcro e uma meia do mesmo tecido nos pĂ©s, ele tentou alguns aĂ©reos. SĂł mais tarde percebeu que criara nĂŁo sĂł um treinamento para âaerialistasâ, mas tambĂ©m uma forma de manobrar nas ondas grandes e manter a prancha encaixada no pĂ©.
:: MERRECAS E TOW-IN
JĂĄ sem os papĂ©is em TV ou cinema, Laird dedicou-se ao mar em tempo integral. Em um dos perĂodos sem vento ou ondas grandes, ele e seus amigos de windsurf puxavam uns aos outros brincando de wakeboard em mares sem onda. Em um dia desses, uma ressaca chegou Ă praia e ele teve uma ideia:
âEu puxava alguĂ©m que depois soltava a corda ou me puxavam e eu depois me soltava. Mas começamos com ondas pequenas, tentando dominar a tĂ©cnica. Naquele momento, tive uma epifania. Aquele reboque podia puxar para as ondas e atĂ© mesmo as maioresâ
No inĂcio da dĂ©cada de 90, a partir desta epifania de Laird, o surfe de ondas grandes explodiu no mundo graças a tĂ©cnica do tow-in (reboque).
:: SURFE DE ONDAS GRANDES
Enormes massas de ĂĄgua que jamais foram surfadas em lugares sem nenhuma disputa por elas. O surfe de reboque (tow-in) mostrou que havia muitos lugares a se explorar. Laird e seus amigos pararam de viajar e voltaram seus olhos a uma onda indicada pela lenda Gerry Lopez. A praia de difĂcil acesso era mais complicada ainda no outside: bombas de 20 metros de altura desafiavam a equipe. Peahi, em havaiano, significa farol. Os americanos chamavam o local de Jaws (TubarĂŁo). Tal qual a boca do predador, as ondas eram ferozes. Depois de Laird, elas tambĂ©m ficaram famosas.
O grupo que descobriu como surfar a onda tambĂ©m sofreu crĂticas ao popularizar o tow-in atĂ© transformar Jaws em um inferno. A superlotação do pico causou acidentes como morte por afogamento e um enorme nĂșmero de atropelamentos por jet-skis.
Com a popularidade em baixa no HavaĂ, Laird Hamilton encontrou a redenção no Taiti. Foram necessĂĄrias duas tentativas para a sorte do surfista mudar. Com, aproximadamente, cinco metros de altura, a Onda do MilĂȘnio o transformou em estrela nos Estados Unidos.
:: SEM LIMITES PARA O IMPOSSĂVEL
Surfar ondas grandes pareceu cada vez mais profissional. Subitamente, Laird Hamilton cortou relaçÔes com a maioria de seus amigos que o rebocavam às ondas gigantes. Para alguns, o trauma do fim dessa relação foi pior, como foi o caso de Brett Lickle, que o puxava em um mar com ondas de mais de 35 metros. Após resgatar Laird Hamilton, a dupla foi engolida por uma onda gigante e levada às profundezas de Peahi. Lickle explicou o que aconteceu depois disso:
âFoi aĂ que percebi que a ĂĄgua estava completamente vermelha. Eu me lembro que passei a mĂŁo na minha perna e ela estava aberta de o joelho atĂ© o tendĂŁo de Aquiles, este foi o rasgo que a aleta da prancha fezâ
Após o acidente, Brett nunca mais voltou ao surfe de ondas grandes (Reprodução)
AtĂ© mesmo nessa hora, o surfe virou prioridade. Por sorte, Laird encontrou o jet-ski, nadou atĂ© ele, resgatou Lickle, o deixou com os paramĂ©dicos e, com os dois tornozelos quebrados, voltou ao mar. Sua motivação em parte foi explicada em espantar o medo pela situação extrema, ou como ele mesmo afirmou: ânĂŁo saberia quando e se teria outro swell daquele pra surfarâ.
:: A INVENĂĂO DO FOIL
Com tanta obstinação, Laird marcou seu nome no surfe graças a uma diversĂŁo com uma cadeira equipada com uma aleta. Durante a brincadeira na ĂĄgua, percebeu que o instrumento, que arrastava a massa de ĂĄgua abaixo da superfĂcie, dava mais força e velocidade na onda. Somndoa-se isso as experiĂȘncias de risco e, mais uma vez, ele encontrou uma solução/invenção.
"Um dos grandes problemas que tivemos com o tow-in foi encontrar estes bumps nas ondas, que Ă© a Ășnica coisa que vocĂȘ nĂŁo quer em uma parede de ĂĄgua de 15 metros"
Laird Hamilton â em entrevista Ă ABC
Assim nasceu o foil, ou quadricĂłptero, que dĂĄ ao surfista o poder de flutuar com uma velocidade e força nunca antes vistas. Para se ter uma ideia do quanto isso pode ser revolucionĂĄrio para o mundo do surfe, criador e criatura demonstram que Ă© possĂvel ficar em pĂ© em uma onda, por mais de quatro minutos, como ele fez em Pascamayo, no Peru:
A vida de Laird Hamilton faz parte da histĂłria do surfe. E o Yahoo Esportes teve o prazer de contar. Caso queira saber mais sobre esta lenda, seu filme, âTake Every Waveâ (tradução: Pegue toda onda) estĂĄ disponĂvel no Youtube e Netlflix.
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